…Acho que pouca gente, assim como eu, entendeu que aquilo, naquela época, era o marco inicial de uma era que mudaria pra sempre nossos conceitos e nossos modos de consumo relacionados à música.
Bom, se bem me lembro era 1999 e a internet surgia como assunto, mas ainda como novidade no Brasil, e por algum motivo ainda recordo das noticias na TV. A antiga MTV trazia a quase todo momento novas informações sobre uma guerra judicial que acontecia nos EUA entra a tal Napter e o Metallica. Sem entender bem o que acontecia, acompanhei as entrevistas, os comerciais, os anúncios do caso.
Anterior e durante a isso as coisas eram bem padronizadas e naturais quando queríamos conhecer e consumir determinado disco ou artista. Tínhamos a própria MTV, revistas e alguns outros programas de música no rádio – tínhamos alguns megastores perto de casa e alguns sebos que vendiam fitas K7, vinis e CDs em alguns pontos da cidade e assim se dava: Você conhecia o artista, pesquisava o que conseguisse sobre ele e ia a algum desses lugares em busca de algum disco, geralmente de venda limitada, que pudesse te dar alguma noção e quem sabe assim formar opinião ou mesmo vir a se tornar fã.
Nos megastores tínhamos a possibilidade de ouvir trechos de 30 segundos de cada faixa de alguns discos, que geralmente eram lançamentos. E nos sebos [No meu caso era a Rua Pedro Lessa no Centro da Cidade e um sebo no Méier], tínhamos sempre a opção do bom papo com o atendente (No meu caso o saudoso Eduardo da Outside), que sempre era referencia e mais bem informado que você. E com um pouco de sorte ele deixava rolar no soundsistem gigante da loja discos ou cd’s que você tinha alguma curiosidade.
Ah sim, o ponto importante deste assunto, naquela época era: Cara, por que cd’s custam tão caro assim? Bom, eu era bem jovem e com pouca grana [Talvez 15, 16 anos e 50 reais no final do mês] E mesmo em 1999 esse valor não era muito, considerando que naquela época o custo de um CD já era em média de R$ 30,00. Ou seja, não dava pra comprar mais de um disco na maioria das vezes.
Estima-se que sobre cada CD nacional ou importado paguemos cerca de 38% de impostos sobre o valor já estipulado do produto, já com os valores e custos de produção e distribuição inclusos. Isso quer dizer que: Mesmo no material nacional, livre de taxas de importação, primeiro se estipula o quanto será gasto para a produção da obra e do material, e sobre este valor se acresce os percentuais de lucros e impostos.
Nunca houve no Brasil distinção de valores para com obras musicais nacionais e internacionais. Os valores sempre foram bem equiparados no que diz respeito ao valor da música.
Voltando ao assunto, a partir de 1999, a indústria fonográfica se colocaria num poço difícil de escalar. A internet e as redes de compartilhamento só tenderiam a crescer fazendo assim com que essa indústria perdesse o controle sobre a distribuição e lucro das obras produzidas, além de tornar o discurso sobre pirataria torpe e sem bases fundamentais para uma discussão que tivesse um fim.
Nessa mesma época em meio a crise musical os artistas mais conscientes já começavam a pensar em formas alternativas de distribuição de material. O Lobão é um desses casos – Após romper contrato com uma gravadora, lançou discos num sistema de distribuição por revistas (Outra Coisa), dando origem assim ao seu próprio Selo: Universo Paralelo, que ajudou a alavancar vários nomes da cena independente no Brasil.
Junto a esse turbilhão de mudanças os artistas mais engajados começaram, nos anos seguintes, a observar e criticar os parâmetros da indústria do entretenimento musical e isso desencadeou uma batalha interna onde esses próprios artistas começaram a usar como arma a própria internet que agora servia para deixar sem ações aqueles que controlavam a musica no mundo. Você se lembra de quando o Radiohead se declarou uma banda independente e lançou seu álbum In Rainbows na internet sobre o lema: Pague o que quiser?!
Eu lembro! E lembro que isso foi um marco na realidade. Uma transição viva acontecendo em uma madrugada e que marcaria para sempre nosso consumo.
Durante e antes disso o mercado já começava a expor sua ânsia por novidades e caras diferentes com novas idéias na música. Esse desejo, munido a essa nova realidade, deu cara nova a produção de bandas independentes e os modos de produção de música existentes.
E então o mundo se fez! E se fez como o conhecemos hoje (Ou achamos que conhecemos).
Essa velha nova realidade perdura até este exato momento em que você está lendo isso. Porém, junto com as vantagens, as reações também são percebidas e muito discutidas.
Se antes os jovens e consumidores de musica tinham um assunto sobre valores, em comum, hoje o artista, em diversas, esferas também tratam de assuntos monetários.
A liberdade de compartilhamento é, pra mim, uma ótima coisa, mas por outro lado, enfrentamos todos, o problema da remuneração da obra e o valor da arte. Tanto para o público que sofre com a qualidade e a possibilidade. E para os artistas que não encontram possibilidades diretas e reais de remuneração alguma para com suas obras.
Existem inúmeras pessoas concentradas nesse pensamento. Alguns com interesses diretos na relação artista, obra e consumidor e outros que simplesmente o fazem por prazer. No ambiente corporativo ou no nicho independente existe um esforço incontável de pensadores que desejam a solução da mediação desse problema.
Todas as formas de distribuição de arte são válidas, em nossa opinião, e tudo que precisamos nesse momento são de boas idéias e mentes dispostas para fazer girar essa grande máquina de música no Brasil e no mundo. Toda essa mudança e confusão nos conseguiram provar apenas uma coisa, e talvez a mais importante: Não dependemos de ninguém para fazer e ouvir música pois somos todos capazes e criativos o bastante para fazer qualquer mercado girar.